segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Diferentes formas de lutar pelos direitos

"Todo homem é magistrado quando se trata de salvar a pátria." Creio que esta frase, encontrada no livro "Da república", de Cícero, é a que explica a excelente notícia veiculada na semana passada: quem foi vereador em São Paulo em 1993 e 1994 (um total de 55 pessoas) está condenado a devolver, cada um, aos cofres públicos, 98 mil reais, por terem aumentado ilicitamente os próprios salários. E isso graças a quem? A quatro cidadãos paulistanos, que processaram esses políticos e tiveram que esperar "só" 17 anos para que a justiça fosse feita. Esses pacientes guerreiros deveriam ser levados ao programa da Marília Gabriela, tanto no SBT como na GNT, para explicar como foi essa saga. Além disso, essa história deveria ser publicada em livro, para depois virar filme. Eis os nomes desses cidadãos: o engenheiro Raymundo Medeiros, a secretária Rosemary O´ Neil Minson, a dona-de-casa Francisca Belizia Shlithler e o representante comercial Paulo Antonio de Oliveira, todos representados pelo advogado Marco Antônio Rodrigues Barbosa.
Esse tipo de notícia, nem preciso dizer, é alentadora. No mesmo dia em que a recebi, sexta-feira passada, pensava desanimada no seguinte contraste: em 1992, conseguimos depor um presidente da República. Mas em 2010, no caso aqui do Paraná, a movimentação popular não conseguiu fazer renunciar o presidente da Assembléia Legislativa de Curitiba (antes de ter sido reeleito, claro). Como é que pode? Também tivemos, também no ano passado, outra vitória, que foi a aprovação da Lei Ficha Limpa, que no entanto é motivo de piada: os alvos juram que não são fichas-sujas e fica por isso mesmo. Um exemplo foi o senhor Cassio Taniguchi, que recentemente disse não fazer parte desse time porque, quando a lei foi aprovada, seus crimes (não foi essa a palavra que ele usou, lógico) já tinham prescrito! Junto a este, quantos casos no Brasil inteiro! E o pior é que o povo ratifica a corrupção e a incompetência, ao continuar votando nesses mesmos políticos. E também em aproveitadores que está na cara que não nasceram para a política.
Estes versos de Bertold Brecht (1898-1956) me fazem refletir: "A atitude crítica / É para muitos não muito frutífera / Isto porque com sua crítica / Nada conseguem do Estado. / Mas o que neste caso é atitude infrutífera / É apenas uma atitude fraca. / Pela crítica armada / Estados podem ser esmagados." Mas seria essa realmente a solução para nós, ou um problema pior ainda? Não há dúvida que às vezes não há outra saída. Por exemplo, a frase do começo desta crônica não é de Cícero, mas de um romano chamado Júnio Bruto Aparente, que chefiou o movimento popular que transformou Roma de monarquia em república, no ano de 509 a.C. Para que isso acontecesse, e a corrupção dos costumes da época pelos monarcas fosse corrigida, foi preciso que o povo se unisse para expulsá-los. De certa forma, foi o que aconteceu na Tunísia, que serviu de exemplo para que o Egito iniciasse a sua própria revolução, os dois expulsando ditadores do poder, depois de décadas. No entanto, esses casos - Roma, Tunísia e Egito - chegaram ao extremo, ou seja, possivelmente não haveria outra maneira de o povo lutar pelo que queria. Movimentos como o dos Caras-Pintadas e este episódio do pagamento dos vereadores de São Paulo mostra que existem outras formas de luta e obtenção de direitos, às vezes usando as ferramentas do próprio Estado, algo que não se deve perder de vista. O próprio Brecht terminava assim o seu poema: "A canalização de um rio / O enxerto de uma árvore / A educação de uma pessoa / A transformação de um Estado / Estes são exemplos de crítica frutífera. / E são também / Exemplos de arte."
Obs: Os dados da notícia foram retirados do site http://www.conjur.com.br/, que por sua vez se baseou na Folha de São Paulo.

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